terça-feira, 23 de agosto de 2011

Cartas.

(...) Pois é, José, 'tão achando que estou com problemas só porque ando sossegado, calado, quase em paz. Pois é, José. Não abalo, não os culpo. Nunca me viram assim; natural que me tentem os instintos. Mas não adianta. Caminho seguro, tenho forças pra me sustentar, pra seguir adiante. Ando bem, não entendem. Vê aí se consegue avisar que o sossego pode ser o melhor amigo do homem, embora um cão possa correr ao seu lado na chuva. Diz que esqueçam essas leis que o mundo impõe, como se pra se mostrar feliz a gente precisasse sorrir o tempo todo, ou pra se mostrar normal, precisássemos ter uma paixão rasgando a alma. E que, por favor, parem de se prender em gaiolas de metal, enquanto o vento norte sopra sadio.
Ontem resolvi só observar. É fácil, se você fingi um certo grau de autismo - como colocar fones de ouvido no máximo, Zé - e observar pequenas coisas ao seu redor. Quero que experimente a sensação. Rostos, bocas que falam e não ouvem, sons que se chocam, sorrisos em fabricação e desmache... Observe, sinta. Depois de tanto tempo falando, tentando, agindo e coagindo, resolvi somente ser. Sei que és um dos que andam, talvez, preocupado e queria só avisar, que mesmo com toda essa correria dá pra sorrir, vez em quando. Sossega, vive, realiza, homem. Parei de tentar mudar o mundo, sabe? Resolvi aproveitar algumas coisas, até então intocadas. Lindas, doces, frescas. Assim que as conhecer melhor te apresento. Deus disse que me ajudaria, para que eu não desistisse de ser quem sou. Assim que me conhecer melhor, não tenha dúvidas: me reapresento. 
Um beijo enorme. Vê se cuida do seu agora, mas não esquece o amanhã, amigo. Dele é que provirá o ontem.

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Mais vale um pássaro que canta, que dois pássaros mudos.

Você nem sabe, mas noite passada sonhei com a gente. Foi cômico, porque no sonho nada tinha mudado: você não tinha ido embora e eu ainda podia descansar a cabeça sobre seu ombro sem que ninguém atrapalhasse.
Lembrei da epopeia desconexa de nossas vidas e achei até engraçado que estivesse se repetindo. O mundo envolvia nossos braços e eu já não podia te sentir.
Nós não pedimos por isso (ou pedimos), mas hora ou outra a física, a química e a má gramática da vida (um salve à magia do Teatro) vai nos dissipar. O que fica disso, meu bem? Fica você em mim. Você e todos os seus olhares. Olhares ferinos, míticos, suaves, sadios. Fica você e toda a sua leveza, sua dureza, sua vida, seu sorriso. Fica você e meu não amor. Meu eterno não amor que, por não ser nada, não acaba. E sabes, tu sabes.
"O que é um pássaro na gaiola?" com esse pensamento te libertei de mim pra não pesar, pra não calhar, pra não acabar. Com esse pensamento te mantive em mim, livre. Pra ficar ao seu lado eu precisava ajeitar o ninho. Pra conseguir te ouvir, o pássaro precisou não cantar. E mais vale um pássaro que canta,  que dois pássaros mudos.
Realinhei o mundo, sem muita dor, pra te ter por perto sempre. Pra não ficar deserto. Pra continuar concreto. Pra te amar mais...
Realinhei o mundo pra você continuar achando graça, pra perder-se na praça, pra abraçar a palhaça, que se vale de sorrisos. E versos.

Não é preciso dizer que te amo.
Tanto.