sábado, 12 de janeiro de 2013

Primeiros erros


Ainda dói. Dói como uma cicatriz que reabre todo dia.
Quase não dói, mas ainda dói. Dói a cada passo que eu dou rumo a meu futuro. Mas quase não dói, sabe? É quase pulsante, quase exposto na pele. Quase não dói mas nunca vai deixar de doer. Estou repetindo o mesmo verbo pra ver se vocês sentem um pouco do que causam. A distância de um e a eterna presença do outro, sem o “um” é a parte que mais agride a cicatriz.
Ver cada foto, relembrar cada momento que eu passei com vocês dois ao meu lado causa uma ferida enorme. Não que vocês tenham ficado alheios a mim. Eu sei que posso contar, sei que posso pedir colo... Mas não é tão aconchegante quanto o calor que vocês irradiavam juntos.
Ei, tem um estranho aqui agora e o que eu mais quero é sair correndo. Não quero ver o que o presente reservou. Não quero saber dessa coisa de quebras de compromisso. Eu tentei amadurecer e me colocar numa posição confortável quanto aos caminhos que resolveram tomar, mas esses oito anos gritam que sou uma criança. Uma criança egoísta. Alguém que não se conforma com brinquedos quebrados. Pelo menos me deixem chorar.
Desculpem-me.

"(...) Nunca me esquecerei desse acontecimento
Na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
Tinha uma pedra
Tinha uma pedra no meio do caminho
No meio do caminho tinha uma pedra"

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Sobre o Oriente

Atente-se porque no próximo minuto você vai ter que me explicar essa nova fase. Isso é repugnância ou paixão exacerbada? Pode falar agora que estou pronta pra suportar suas arrogâncias.Ou melhor, seus desvios. Te disse há um tempo: "tá na hora de crescer" e você diminuiu. Esse estilo Alicizinha no País das Maravilhas não combina com você - tirando a parte consumível da coisa.
Estou meio horrorizada com essa sua nova conduta de ignoro-tudo-mesmo-e-doa-a-quem-doer. Não é você. Mas sou eu a parte que corre atrás pra salvar algum décimo de sorriso dado lá no milênio passado que você fez questão de pisotear. Não, não, me enganei: o único sorriso pisoteado foi o meu. Lembro até de ter encontrado o pedaço que cortou da foto. Um sorriso familiar. Um sorriso que eu tento dar pro espelho toda vez que lembro de você correndo pra mim. Sim, sim, um filme popular; uma comédia entre seres que se amam pra eternidade que no meio da projeção vira um classe "A", desses que você adora assistir. Finais não-óbvios, gente se separando e indo pra sempre pra outro país.
Você escolheria o qual? Marrocos? Suécia? China? Talvez esse último seja uma boa pedida pra você... Ou sei lá, Japão - qual deles as casas são minúsculas, mesmo? Descubra e se mande pra lá. Antigamente você adoraria a Escócia. Casas enormes; jardins transbordantes de flores, grama, terra molhada; um clima de família envolvendo uma cidade inteira... Um minuto... Acho que essa aí sou eu. Sim, lembrei, sou eu. Você estava tão em mim que nem percebi que coloquei meus gostos atrelados aos seus. Errei (novidade!). Já que você prefere as superfícies rasas vá pra algum país oriental se esconder do resto do mundo. Ou de mim. Tanto faz.
Mesmo.
Ou não.
Talvez eu ainda me importe.
Na verdade me importo com você, com seu futuro e com seus méritos perdidos, mas sem interferir, vou deixar que escolha pra onde quer ir. Não me importo em não te ajudar a decidir, talvez eu receba um postal depois. Ou um "já faz dez anos que partiu, você não sabia?". Eu vou aceitar.

terça-feira, 20 de novembro de 2012

Poesia rasgada

É porque todo mundo é metade
Todo mundo é meio rabisco, meio desgaste.
Todo mundo é meio papel rasgado, folha pintada.
Meio descolorido, bagunçado, cortado.
O mundo é uma cura pros males da idade. A idade é uma cura pros males do mundo.
E a gente anda - meio - junto
metade à parte.

Com regras, sem sinfonias
Sem regras, com alegorias.
Minh'alma 'tá assim: navego sem poesia.



sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Descolorindo: escura, parda

Para quê servem os filmes franceses? Você vai me ensinar ou me deixar tamborilando os dedos aqui enquanto eu ensaio qualquer coisa pra parecer menos dramática? Quando eu acho que aprendi a andar, aparece uma pedrinha no chão e me faz tropeçar três quilômetros. São três quilômetros esfregando a cara no chão, rasgando os nós dos dedos tentando me impôr um freio pra ver se hoje, hoje, hoje eu consigo concretizar algum feito que não seja um arfar cansado de esperar.
Uma garota apareceu e disse "Escreve. Escreve isso aí. Escreve que passa". E eu achando que essa fala fosse minha, achando que eu já soubesse disso, achando que não estava perdida. Bobagem. Nós sempre iremos nos perder no caminho. Quando ela me olhou e pediu com aqueles olhos - que eu ainda vou ver sorrindo em fagulhinhas anônimas de luz - não pude resistir. Parecia que naquele momento eu havia escrito um filme e entregado o roteiro a ela. Ela, que eu sempre admirei de longe, me pareceu tão perto. Me apareceu tão perto. Quase "junto, sem caber". E eu agradeci, porque, querendo ou não, por sorte ou azar dela, gostei do que ela representou. Gostei porque ela me mostrou que uma casa inabitada não é um lar. Tão básico... E eu procurando um sentido oposto pra não desabar.
Aprendi que posso desabar quando eu quiser, porque alguém, num dia de muito sol, de muita luz, de muito medo, criou as palavras e nos emprestou.  Assim como eu emprestei esse texto a ela, convidei a entrar na dança e ofereci metade do meu coração. Metade, porque todo é meu. E é meu porque tem todos. Incluindo ela. Agora, já.

terça-feira, 26 de junho de 2012

"Brevidades"

Você já explicou poesia, dona Maria?
De mim, a voz judia. Diz: agora não.
E eu vou ouvir, dona Maria?
E eu vou sentir, dona Maria?

Eu não, eu vou seguir. Talvez sentir, talvez sorrir, talvez ouvir.
Mas enfrentando. Em frente, avançando.
Correndo, andando, marchando. Sem parar.

domingo, 3 de junho de 2012

Pródigo

Encontrei o meu lugar. Engraçado pensar que ele é exatamente igual ao anterior. Tem luz, tem sol, tem vida. A diferença é que fui eu que escolhi.
E ele me acolheu.
Também me escolheu.
Estou viva.
Fragmentos podem se unir.
E eu só queria silêncio agora.
Sorrisos são mais importantes.
Não sinto mais frio.
Obrigada, estou em casa.

sexta-feira, 25 de maio de 2012

O segredo do sol na lua

Hoje vi três sóis, compreendi Deus, abracei o garotinho, corri até o quintal, apertei o dolorido, li em maio, Setembro, gostei de ser simples, fui mágica, contei risos, soltei pássaros, amei uivos, comi flores. Hoje eu nem soube o que era dor, não soube o que era erro. Não senti raiva, não chorei, não tive vontade de dormir, folheei o jornal, li a matéria sobre economia, pulei raminhos de mato no chão quebrado da calçada, olhei pro lado e vi. Vi o que não via, o que não queria ver, o que deveria ver e o que se escondia. Até consegui escrever, veja só.
Também senti-me útil, traduzi a canção que fizeram em russo, atravessei a ponte e um peixinho-sapo-lagartixa pulou pra me desejar boa caminhada.
Corri algumas milhas e encontrei os brinquedinhos enterrados no mesmo lugar. Todos com um cheiro de infância sem tamanho.
A menina olhou pra mim meio de lado e eu dei o maior sorriso que pude. Ela quase caiu da bicicleta tentando imitar meu sorriso. Para alegria dela. Para a minha. Para a nossa. Todos os meus órgãos sorriram e meu estômago roncou - já era de se esperar.
Fui na padaria que vende sonhos de pré-escola e comprei cinco. Comi todos. Exceto por um que a cachorrinha levou pra ela e o marido.
Voltei contando piadas e as pedras quicaram feito bola. Então os três sóis transformaram-se em uma enorme lua. Eu sempre soube que a lua cheia tinha algum segredo. Três sóis. Impossível de se imaginar.
A nuvem a encobriu, compreendi que era hora de voltar. Voltei.
Agora sou o silêncio. Agora escuto. Agora tenho três sóis. E um coração


na boca.

sábado, 10 de março de 2012

Nem armas, nem poemas.

Talvez sejam duas da manhã. Eu não tenho tempo pra nada. Ocupei as horas ficando parada olhando para o espelho. Três braços e nenhum nariz. Que coisa triste não sentir cheiros. Gosto tanto dos papéis antigos. A única coisa que sinto fazer com eles é espirrar. Cinco horas seguidas abraçando o mundo e nada de ninguém pegar minha mão, dizer "ei, pode parar de abraçar tanta gente e me abraçar agora?" e verificar se penteei o cabelo. Tem dois cachos aqui do lado, tá vendo? O pente quebrou o dente do meio e eles ficaram esquecidos aí. Você gosta? Faça mais dois do outro lado. Eu não tô entendendo o que é isso aqui perto da orelha mas tô olhando. Você está vendo? Eu não queria abraçar o mundo, eu queria te abraçar. Ontem até te vi perto do espelho, mas daí acordei. Dei aquele sorriso de lado que você dava. O carinha que faz computação também. Ele perguntou o meu nome. Eu não perguntei o dele porque o único nome que eu queria sendo anunciado naquela biblioteca gigante era o seu. Ele pegou minha mão, indicou livros, cursos. Quem o deixou fazer isso? Ele é só mais um babaca tentando passar por inteligente. Cansei disso tudo. Cansei dos meus braços. Ainda mais porque eles não podem pegar uma droga de telefone e discar seu número. Tão idiota essa coisa de limites. Tão idiota essa coisa de se precaver, de se frear. Meu colo tá vazio. Minhas mãos também. Mas tem tanta coisa nesse peito, nesses meus olhos, nessa minha falta de olfato. O vidro de perfume que eu guardei com umas gotas de seu cheiro comprado secou. E eu nem ousei usá-lo. Tanto cuidado pra não deixar as gotas evaporarem... Luminosidade adequada, clima propício e nada adiantou? Foi assim que acabou o que você um dia sentiu? Você deixou pra lá e quando menos esperava já não existia? Porque se foi, infelizmente me certificarei de que eram somente gotas. Um vidro inteiro não secaria. Não secaria, um vidro inteiro não secaria, tô repetindo pra mim, quase em voz alta, quase pro vizinho da terceira quadra que ouve os carinhas do Hawaii me ouvir. Ei, não seca, né? Abaixa isso aí. Engenheiros hoje não. Hoje não. Porque, ei, "eu abri meu coração como se fosse um motor e na hora de voltar sobravam peças pelo chão.". Talvez eu não tenha ido à luta, seu vizinho. E nem pago pra ver. Mas, me diz aí: o que te faz querer ouvir? Senta aqui, me conta. Os caras de lá da festa não prestam atenção nos detalhes. Os que prestam insistem em comentar pra eu ver que perceberam. E eu acabo escondendo todos os detalhes pra não faltar quando alguém de verdade voltar a acompanhá-los. Pode dizer que é bobo. Sensata, eu? Não, vizinho. É só pra não perder tempo mesmo. É só pra continuar inteira. É só pro motor continuar funcionando. Não, eu não quero um CD, eu quero mais um travesseiro. Embora já tenham uns cinco na cama. No meio da noite jogo todos no chão e estico as pernas. De manhã choro porque não tem nada por perto pra abraçar. Não sou interessante. Você que é igual a todos os outros. Pode ir agora, vai ouvir seu som de novo. Só que baixo dessa vez. Não adianta jogar a dor ao vento que ele não ouve. O vento ouve os pássaros. E só.

sábado, 11 de fevereiro de 2012

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Os saltimbancos em um carnaval sem fim.

Nascia, em 1944, um verdadeiro amante. Das letras, das mulheres, da música. Se pertencesse ao norte-nordeste, eu poderia dizer que nasceu em meio ao fogo das comemorações juninas, mas não. Trinta e quatro anos depois, em fevereiro e na agitação do carnaval fluminense, após a boemia e o rock aparentemente terem perdido o seu charme, frente a tantos outros ritmos dominando o país, eis que nasce outro grande poeta musical.
Primeiro, com todo respeito e admiração, falo do poeta-teatrólogo-cantor-compositor-escritor, enfim, artista, dos olhos de ardósia (assim definidos pela polícia, numa ficha preenchida, quando jovem) e uma alma vasta de doçura e sensualidade, Francisco Buarque de Hollanda. Nosso Chico. Nosso menino socialista, que nasceu na mesma cidade do ainda bebê, Marcelo Camelo. Um bebê barbudo, que convida a juventude do segundo milênio a admirar composições limpas, livres de órgãos sexuais ralando no chão, na parede, no escuro.  Dois “jovens”(com algumas muitas aspas pendendo para o lado do garoto trilingue, das marchinhas de carnaval) que proclamam o amor. O amor que dói, que arde, que queima. O amor que sustenta, que produz. O amor operário, o amor no último romance, o amor amor, o amor atrás da porta, o amor da menina bordada, da imaculada, das meretrizes.
Quem não conhece Geni, também não conhece a crítica social presente na língua de Chico. Uma língua que lambeu a paixão, mas que ajudou a abocanhar as mazelas sociais e reuní-las em contos cantados há cerca de 50 anos.
Entre Chico e Camelo, não somente uma letra em comum em suas inicias artísticas, mas um dicionário musical, onde eles, mesmo separados por anos de idade e décadas de divergentes conflitos públicos, concretizam a música como um instrumento de luta, de ideologias e manutenção de ideias, e acima de tudo de sentimentos, mostrados na fila do pão ou nas vitrines, pra ver a moça e a banda passar.